Joinville, a criança e o amor #14
Joinville foi uma passagem muito interessante, não só pra jornada, como pra minha vida. Fiquei apenas dois dias na cidade, e vou dividir em dois nomes os momentos e sensações que vivenciei (vivi e senti em profundidade) estes dois dias: André e Juliana.
1. André
Meu pai viajou a trabalho para Joinville, alguns meses antes de eu iniciar a jornada. Lá ele conheceu o André, um Geógrafo da minha idade, que já fez umas trips bacanas por aí. Comentou sobre meu projeto e me passou o contato do André. Trocamos umas ideias pela internet por alguns meses e, como parte do trajeto, combinamos que passaria por Joinville para fazermos ao menos uma trilha juntos.
Cruzei para o terceiro Estado da jornada, Santa Catarina, e cheguei em Joinville ainda no Sábado, após deixar Curitiba e a família Marfil. André me recebeu com uma boa cerveja e ótimas conversas. Ouvimos umas boas músicas enquanto ele me contava suas histórias e dicas de viagem (uma simples e sensacional, para aqueles que me perguntam como eu lavo as roupas: Lavar não é o problema, o problema é secar. Para isso, duas sugestões simples. 1: coloque-as no painel do carro ou no tampão do porta-malas para que tomem sol (isso, claro, se não estiverem encharcadas e se estiver sol). 2: (essa é demais) abra os vidros, encaixe as pontas das roupas de forma que fiquem um pouco pra fora e feche os vidros, e saia dirigindo tranquilamente! Hahaha…em sua próxima parada, suas roupas estarão secas). Ainda arriscamos sair num baita frio pra conhecer um PUB, mas voltamos cedo pra casa, já que uma bela trilha nos aguardava no Domingo bem cedo.
Segundo o André, havia dias que o Sol não aparecia, os últimos dias estavam bem nublados. Verdade ou não, acordei às 7h30 com um belo céu azul. Às 9h30 já estávamos subindo uma linda serra de carro, chegando ao ponto de start da trilha do Castelo dos Bugres.
Eu não sabia o que me esperava, mas pelas altas conversas sobre trilhas, natureza e lugares maravilhosos que já vinhamos tendo, confiava que o André sabia o que eu queria ver. E, rapaz, ele sabia! Há duas trilhas que acessam o Castelo, uma mais nova e mais “fácil”, e outra mais antiga, que cruza por diversas vezes o riacho. Pegamos a trilha antiga pra subir e a nova pra descer. Quando eu digo subir, meu amigo, foi subir. A trilha é linda demais! Mata fechada, cortando várias vezes o riacho. O som da estrada mais próxima abafado pelo silêncio ensurdecedor da natureza. Duas horas e meia de caminhada, nas quais viajamos em conversas sobre o espaço, seixos rolados (pedras gigantescas inacreditavelmente posicionadas a centenas de metros do nível do mar, me explica?!), e passos em silêncio, presos em nossos próprios pensamentos e contemplações.
Bom, como imagens valem mais que palavras, vou apenas colocar as fotos de lá de cima. Agradecimento aos participantes especiais do dia: Sol e céu azul.
Voltamos pela trilha nova, extremamente contentes com o dia impecável e a magnitude do Castelo dos Bugres. Ainda passamos por uma pequena cachoeira que, não fosse o frio, mesmo com sol, arriscaríamos um mergulho. Fica pra próxima…melhor irmos direto comer um pastel sensacional que tem no caminho de volta! Hahaha
Voltamos pra casa, exaustos. Só um cochilo pra reanimar. Ainda que já estivesse escurecendo quando acordei, meu dia estava apenas começando. Tinha mais uma viagem que eu precisava fazer naquele domingo, e a estrada que percorre esse caminho era muito mais perto do que eu imaginava…era uma viagem interna,
2. Juliana
Alguns dias antes de chegar a Joinville, quando ainda estava na chácara Marfil, em Bocaiuva, recebi uma solicitação de amizade pelo Facebook. Quase caí pra trás quando vi. Juliana, meu primeiro amor de infância. Sabe o filme “Meu primeiro amor”, com Macaulay Culkin? Então, a história não tem nada a ver com a nossa…hahaha…mas o sentimento pode trazer alguma semelhança. Era puro, era verdadeiro, era ingênuo, era o amor de duas crianças que nem sabiam entender ou descrever aquele sentimento tão espetacularmente devastador. Aos 10 anos de idade, Victor e Juliana foram namoradinhos na escola. Victor com todo seu romantismo, Juliana com toda sua timidez. Ambos com uma insegurança danada!
Foi ver a solicitação de amizade dela, que eu fiz essa primeira viagem interna. Acessei lembranças que eu achei que nunca tivessem existido, ou que eram apenas sonhos. Isso em alguns segundos, observando sua foto, e as fotos de sua princesa, que agora está com 8 anos, mesma idade em que os pequenos Victor e Juliana se conheceram e se apaixonaram. Checando de leve como andava a vida dela pelo Facebook, o choque: ela mora em Joinville! P#$%#pariu!
A ansiedade tomou conta de tudo. Tanto eu quanto ela não sabíamos o que fazer. Cara, em alguns dias eu passaria por Joinville! Nos encontraríamos? Ou melhor não? São quase 15 anos sem contato! Era como encontrar um porão lotado de coisas que você nunca ousa mexer! Mas era inevitável, iríamos nos ver, tivesse o impacto que tivesse em nossas memórias mais trancafiadas, precisávamos nos encontrar.
Volto àquele fim de tarde do domingo. O coração saltava do peito, as mãos frias e uma tremedeira incontrolável. Não era frio, era a caixa de Pandora chacoalhando dentro do meu ser. Uma caixa de Pandora que não trazia pragas, obviamente, mas que em seu lugar poderia desencadear qualquer reação. Efeito Borboleta.
Dirigi até o endereço que ela me passou. Avisei pelo celular que a aguardava no portão, aquele bendito frio na barriga. Ela apareceu, com exatamente a mesma timidez e o mesmo sorriso que após 16 anos, ou que outros 50 a mais não fariam desaparecer de seu rosto. Estávamos ali, dois indivíduos que acreditavam ser adultos, bem resolvidos, maduros, ambos perdidos no infinito de suas lembranças infantis. Duas crianças, novamente, sem entender o que estava acontecendo.
A coisa iria piorar (ou melhorar..rs). Juliana tem guardadas, com todo carinho, várias das cartinhas românticas que lhe escrevi aos 10 anos. Um álbum todinho com fotos de vários momentos do 4° ano, quando éramos “namorados”. E seu diário, que ela me confiou algumas páginas, onde toda a verdade foi descoberta. Nosso amor era mesmo puro, verdadeiro e ingênuo. E era recíproco. Que coisa mais curiosa essa de amor…o pequeno Victor cheio de insegurança pois achava que ela não gostava dele. Tudo isso pois ela se recusava a dar-lhe o primeiro beijo da infância, e porque ela simplesmente não chegava perto dele. Eram declarações atrás de declarações de amor feitas ao telefone e por cartas, mas ela nunca conseguia ficar 5 minutos perto dele, e ele tinha medo disso. Dezesseis anos para o Victor descobrir que ela não conseguia chegar perto dele, simplesmente poque também não sabia lidar com o forte e inocente sentimento que não lhe deixava aproximar. Dezesseis anos pra descobrir que nenhuma insegurança era necessária, que basta deixar que o amor o conduza. Parece tão óbvio…
E foi através das cartinhas, fotos, diários, conversas e lembranças, que acessamos novamente nossas crianças interiores. Que viagem espetacular que fizemos no tempo! Tempo e Espaço, ahhh, vocês dois aqui de novo, pra ordenar o Caos e bagunçar a Ordem. Vós fizestes com que ela e eu tivéssemos lapsos do que teria sido nossa história, se alguma borboleta tivesse mudado a direção do seu bater de asas (ou foi, ou está sendo, em outra dimensão). Viajamos no tempo e no espaço como no filme Efeito Borboleta. Nos vimos em cenários completamente diferentes. Ela me contava lembranças que eu achava que eram só minhas, ou que eram sonhos. Ficamos conversando por horas…muitas horas…
Ah, Vida, que caminhos tu resolve me apresentar, assim, repentinamente?! Eu sabia que tu irias me aprontar poucas e boas. Sabia que tinha coisas pra fuçar aqui dentro. Sabia que desconstruiria minha própria figura, a fim de me conhecer melhor e me construir novamente. Foste ousada, Vida, e como sou grato por isso.
Deixei Joinville completamente desnorteado, mas sabendo exatamente quem eu era, e quem eu sou. Reencontrei um menino apaixonado e que, outrora demais inseguro, agora vivo, forte e confiante. Juliana é um presente. É passado e presente. E em alguma outra realidade, como no filme Efeito Borboleta, provavelmente futuro.
Teu amor está bem protegido aqui dentro, menina.
Fotos e comentários no Facebook: Efeito Borboleta (Victor Reider Loureiro)
Obs.: O conteúdo é de total responsabilidade do colunista e não representa a opinião do Já Fez as Malas.Veja também:
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